Por que alguns cristãos não entregam seus dízimos e ofertas?


Este é um dos temas que mais provocam discussões no meio evangélico. E não é difícil entender as razões!

Tudo o que envolve dinheiro mexe com os ânimos e chama a atenção, pois, onde há concentração de riquezas, há poder de ostentação e liberdade para satisfazer prazeres, mas, na sua ausência, surgem desconforto, ansiedade, crises nos relacionamentos e até mesmo revolta com a vida.

A Bíblia trata desse assunto com enorme clareza e seriedade, desde Gênesis 3:6, quando o homem ousou atender aos seus desejos, subestimando o que Deus havia ensinado.

Com uma rápida pesquisa na Bíblia, descobrimos facilmente inúmeros ensinamentos sobre riquezas e sobre como lidar com elas. Ela não condena a prosperidade, mas alerta sobre os perigos que a cercam (1 Tm 6:10). É nesse contexto que o povo de Deus é instruído sobre o princípio de que “mais bem-aventurado é dar do que receber” (At 20:35).

A Bíblia ensina que a entrega de dízimos e ofertas deve ser destinada prioritariamente à manutenção daqueles que vivem do Evangelho (Nm 18:21-32; 1 Co 9:14; 1 Tm 5:17). Isso inclui a plantação de igrejas bíblicas e o socorro aos pobres e necessitados (Dt 26:12-15). Sob uma perspectiva mais profunda e motivacional, essa entrega deve ser acompanhada de temor (Dt 14:22-23), gratidão (Gn 28:20-22) e adoração a Deus (Gn 14:18-20; Pv 3:9-10; Hb 7:1-6).

Ainda assim, alguns se esquivam e resistem, por diversos motivos:

Avareza

Nenhum cristão consciente da fé bíblica admite a idolatria, visto que a compreensão mais popular desse conceito está associada à veneração de relíquias de pessoas santas do passado ou de esculturas que materializam crenças em deuses criados pela imaginação. No entanto, à parte dessa prática, a Bíblia afirma que o forte apego ao dinheiro e ao que ele proporciona, acima dos valores espirituais e do cuidado com o próximo, também é idolatria (Cl 3:5).

Não foi sem motivo que Jesus advertiu seus discípulos sobre esse perigo (Mt 6:24). Enquanto alguns, por desprezo ou ignorância, se esquecem de Deus e fundamentam suas vidas sobre as frágeis areias da incredulidade e do egoísmo, cultivando uma falsa e provisória sensação de segurança, ele alertou que ninguém pode servir a dois senhores.

Contra essa conduta, Jesus ensinou seus discípulos a servir a Deus, e não às riquezas (Mt 6:19-21), pois somente ele é digno e apenas ele pode sustentar seu povo enquanto caminha rumo ao que é imperecível.

Portanto, servir a Deus, inclusive utilizando os recursos obtidos neste mundo como instrumento para esse propósito, deve ser uma motivação maior do que qualquer outro anseio para o cristão verdadeiro.

Deus não se agrada quando fechamos os olhos para os pobres e necessitados (Pv 21:13), nem quando deixamos de entregar dízimos para a manutenção de pastores e missionários, dedicados à pregação do Evangelho e à plantação de igrejas ao redor do mundo (1 Co 9:13-14).

Medo

Pessoas que vivem com rendas baixas e ocupam vagas de emprego instáveis podem se sentir intimidadas a fazer doações por medo de passar por maiores necessidades ou de aumentar suas dívidas.

É inegável que o brasileiro vive sob a opressão de altas cargas tributárias, consideradas elevadas em comparação com a média mundial, além da inflação (extraoficial) que afeta produtos básicos de subsistência. É principalmente nesse cenário que surge o receio de fazer doações financeiras, entregando dízimos e ofertas.

Contudo, Deus tem conhecimento dessas dificuldades e nos ensina a “dar a César o que é de César”, ou seja, a pagar tributos ao Estado, sem, porém, negligenciar a entrega do que pertence a Deus (Mt 22:15-22), confiando nele como fonte de todas as nossas necessidades (Sl 23, 37:25; Mt 6:9-11, 25-34).

Por meio dessa prática, o Senhor disciplina seu povo a confiar mais nele do que nas riquezas, a cuidar uns dos outros e a participar da divulgação do Evangelho no mundo, mantendo-se no caminho oposto à incredulidade e à idolatria.

Mau testemunho

Um dos maiores desastres morais em uma igreja é o mau testemunho daqueles que deveriam ser exemplo do que ensinam e exigem. A posição de liderança carrega forte influência na congregação, pois os líderes não são apenas vistos como aqueles que estão à frente, indicando e guiando pelo caminho, mas também como depositários da confiança que recebem.

Infelizmente, no cenário evangélico brasileiro, são notórios os escândalos relacionados às arrecadações dos fiéis. São campanhas abusivas, sustentadas por chantagens e ameaças de maldição; comercializações da fé, conduzidas por charlatanismo e heresias, propondo barganhas com Deus; ausência de prestação de contas transparente por parte de igrejas; inversão de prioridades, com mais investimentos em patrimônios físicos do que em pessoas; e a infidelidade de líderes, que deveriam ser os primeiros a entregar seus dízimos e ofertas, pois não estão acima, mas sujeitos ao mesmo preceito bíblico que os demais.

Na Igreja cristã primitiva, os líderes tinham o dever de entregar suas contribuições (At 4:36-37), tanto quanto os membros comuns (At 5:1-4). A quebra desse princípio não apenas desmotiva a fidelidade dos membros de uma igreja, mas também desmoraliza a ética bíblica, que exige que os líderes sejam um padrão para os fiéis. Apesar disso, a falta de alguns não justifica a falta de outros, pois o dever de consciência é muito mais individual do que coletivo.

Confusão doutrinária

Alguns argumentam que não entregam seus dízimos e ofertas porque essa prática, iniciada pelas leis do Antigo Testamento, foi abolida com a inauguração do Novo Testamento. Contudo, esse argumento não é válido, visto que, no Antigo Testamento, a lei foi acompanhada do princípio que o Novo enfatiza (Mc 12:41-44; At 2:41-47; 4:35; 5:1-11; 2 Co 8 e 9), sem revogar sua prática (At 4:36-37; 5:1-4; 6:1-3) e sua administração (At 4:35-37; 5:2; 11:29-30), mas condenando a hipocrisia (Mt 23:23), a negligência (Mt 22:15-22) e a avareza nesse assunto (2 Co 9:5).

Outros afirmam que não consagram seus dízimos e ofertas a Deus porque essa prática foi exigida apenas dos judeus, não da Igreja cristã. Entretanto, esse argumento também não é válido, se considerarmos que, apesar de o sistema de arrecadação judaico não ter tido a mesma compreensão legal para os gentios, o apóstolo Paulo ensinou nas igrejas cristãs, entre os gentios, que não se omitissem de fazer arrecadações (1 Co 16:1-2). Essas arrecadações deveriam ser proporcionais à renda de cada um (At 11:29; 1 Co 16:1-2; 2 Co 8:3), e é provável que o parâmetro para esse cálculo tenha sido a décima parte, pois essa foi a herança que o apóstolo recebeu da tradição judaica.

Concluindo

A entrega de dízimos e ofertas não é simplesmente uma ajuda para a manutenção das igrejas, pastores, missionários e pobres, mas um dever e privilégio de todo cristão sério e coerente com sua fé, como ato de submissão ao ensino bíblico, e não uma ostentação de poder sobre aqueles que dependem das arrecadações para viver. Essa altivez insulta a Deus, que instruiu e ordenou a prática de consagrar parte da renda pessoal, sendo ele o único detentor de todas as riquezas do mundo (1 Cr 29:12; Sl 24:1; Ag 2:8).

Essa prática redunda em glória a Deus (2 Co 9:11-15), e as ofertas lhe chegam “como aroma suave, como sacrifício aceitável e aprazível a Deus” (Fl 4:18). Quando compreendemos isso, a entrega dos dízimos e ofertas, com fidelidade e regularidade, transcende o dever cristão e se transforma em alegria cristã.

“uns dão com generosidade e têm cada vez mais; outros retêm mais do que é justo e acabam na pobreza” (Pv 11:24 NAA).

Rev. Ericson Martins

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