O Livro de Atos registra que a Igreja cristã primitiva experimentava vertiginoso crescimento espiritual e numérico, tinha paz e o conforto do Espírito Santo, “edificando-se e caminhando no temor do Senhor” (At 9:31). Não podemos deixar de observar que ela, nessa condição, possuía um sistema de governo e, assim, se prevenia das corrupções, julgava temas teológicos polêmicos, maus obreiros e falsos mestres, disciplinava os faltosos e atendia necessidades dos menos favorecidos.
Reconhecemos que estamos, talvez, como nunca antes, vivendo uma terrível crise de autoridade moral por parte dos nossos representantes, não apenas na esfera política, mas também na eclesiástica. Essa fria realidade tem, gradativamente, drenado nossas melhores expectativas, causando, em nós, apatia e a fragilidade institucional da Igreja. Contudo, não é razoável a manutenção dos danos do pecado e assumirmos uma condição de conflito com a necessidade de confiança em nossos líderes espirituais, quando as Escrituras exigem exatamente o contrário dessas condutas.
Pensando nisso, pretendemos destacar aqui quatro razões pelas quais necessitamos confiar em nossos Concílios, formados por pastores e presbíteros, considerando, especialmente, o contexto da Igreja Presbiteriana do Brasil:
1. Razão bíblica.
A história revela que o crescimento da Igreja exigiu a organização de um sistema de governo eclesiástico (At 6:1-7), formado por um Concílio de apóstolos e presbíteros, os quais julgavam a favor da sã doutrina (At 15:1-29), confirmavam Igrejas (At 15:41) e as condutas cristãs (At 18:23). Disciplinavam dos faltosos (At 5:1-11 cf. Mt 18:17-20), designavam e orientavam seus obreiros (At 11:22, 13:1-3, 14:26; Gl 2:9-10; 1 Tm 5:22) e garantiam a assistência aos necessitados, através de servos eleitos especialmente para esse fim (At 6:3-6). Assim, a Igreja era governada, por líderes, cuja autoridade espiritual era reconhecida e respeitada (At 9:26-30, 15:2), e confirmada pelo voto (At 6:3, 14:23). Percebemos que, no princípio, as Igrejas estavam assim organizadas. Elas tinham seus Concílios locais e estavam sujeitas a autoridade de um Concílio superior em Jerusalém (At 16:4-5).
2. Razão confessional.
As mais notáveis confissões reformadas, reconhecem o sistema de governo conciliar como sendo o mais bíblico. É o caso, por exemplo, da Confissão Belga (Arts. 30-31) e da Segunda Confissão Helvética (XVIII-10), além das quais, a Confissão de Fé de Westminster (CFW), a última das Confissões formuladas, durante o período da Reforma Protestante (1649) e considerada a mais significativa delas, registra, no capítulo XXX-1: “O Senhor Jesus, como Rei e Cabeça da sua Igreja, nela instituiu um governo nas mãos dos oficiais dela; governo distinto da magistratura civil (Is 9:6-7; 1 Tm 5:17; 1 Ts 5:12; At 20:17, 28; 1 Co 12:28).” O entendimento da CFW é que o Senhor Jesus instituiu e exerce governo na Igreja, através dos seus oficiais, enquanto estes “permanecerem fiéis às Sagradas Escrituras” (CI/IPB, Art. 14-D), cabendo, portanto, aos membros dela obediência e santo temor (Pv 8:15; Rm 13:1-2; Tt 3:1; 1 Pd 2:13-17).
3. Razão conciliar.
O sistema de governo representativo ou conciliar deve existir e ser preservado com confiança, porque se mostra o mais seguro para o bom funcionamento da Igreja, a fim de preservá-la de lideranças abusivas, autoritárias e perversas, e de confusões, tanto doutrinárias quanto morais dos seus membros. Nele, o governo se concentra e é exercido pelos Concílios e não por um ou outro oficial. Todas as necessidades (doutrinárias, funcionais e disciplinares) são avaliadas e debatidas democraticamente no Concílio, por várias perspectivas, e decididas privativamente, quando não por todos, pela maioria dos seus membros. As Escrituras afirmam: “Não havendo sábia direção, cai o povo, mas na multidão de conselheiros há segurança” (Pv 11:14) e insistem: “Onde não há conselho fracassam os projetos, mas com muitos conselheiros há bom êxito” (Pv 15:22). A sabedoria Divina indica que entre conselheiros a segurança e o bom êxito são melhor discernidos, porque, sozinhos não sabemos tudo, não somos totalmente capazes, não prevemos o resultado de todas as decisões e porque somos perturbados por dúvidas imprevisíveis. Mas quando nos submetemos aos conselhos de um Concílio, somos amparados pela confiança das melhores decisões, mesmo quando eles não sejam os que mais gostaríamos.
4. Razão ética.
As Escrituras exigem que, para assumir qualquer ofício eclesiástico, os homens precisam atender rigorosas qualificações quanto a Deus, aos outros, a si mesmos e a família (At 6:3; 1 Tm 3:1-13; Tt 1:5-9) e, somente esses, podem ser indicados e com confiança serem eleitos pela Igreja como seus representantes, no Concílio local. Em tese, a Igreja elege aqueles que comporão o seu próprio Concílio, segundo as suas melhores avaliações, ou seja, os que ela mesma julga serem os mais qualificados para a liderança espiritual e administrativa.
O Concílio é falível, por ser composto de homens falíveis, mas está sob a autoridade do supremo juiz, o Espírito Santo, quem julga as suas controvérsias na e pelas Escrituras (CFW, XXV, Seção VI), tendo que prestar contas aos Concílios que lhes são superiores. Apesar disso, ele ainda representa – com suas imperfeições - o governo de Deus na Igreja. É coerente, portanto, o reconhecimento da autoridade de Cristo nele revelada. Também, os que para tal foram eleitos criteriosamente pela Igreja e devidamente ordenados, são, por coerência ética, carentes das nossas orações, compreensão e cordialidade, dignos do nosso incentivo e sincera confiança.
Por essas e outras razões, confiamos no Concílio e recomendamos que, também, confie, tributando assim, honra ao Senhor Jesus Cristo, Cabeça da Igreja!
Com amor,
Ericson Martins
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