Miguel e o fascínio da cosmovisão não-cristã


Compartilho aqui um diálogo, por e-mail, com um jovem universitário fascinado pela recente descoberta da cosmovisão não-cristã. Ele é desafiado a pensar mais profundamente sobre sua recusa de aceitar o testemunho bíblico como norma de fé e prática. Fiz uso de uma técnica de discurso na qual o sujeito projeta o leitor e discute com ele. Portanto, os personagens Miguel e Heitor são fictícios, embora o enredo coincida com a realidade.

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Em 15 de nov de 2017, à(s) 13:37, Miguel Imaginário escreveu:

Olá Ericson! Consegui seu e-mail com o Heitor. Não sei se ficou sabendo, mas consegui entrar na Faculdade, você acredita? hehehe. Depois de tantas reprovações no ENEN consegui entrar no curso de Filosofia, na UFW. Cara estou fascinado, pois estou compreendendo a vida de maneira bem mais ampla que a Igreja me ensinou. Tenho descoberto que estava “preso” a uma maneira muito “fechada” de ver as coisas, porque não existe uma verdade absoluta. Sinto que estou sobrevoando por escolher viver como acho melhor. 

Olha, qualquer dia desses vamos nos encontrar, tenho muito mais para compartilhar contigo. 

Até mais meu amigo!

Miguel Imaginário
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De: Ericson Martins
Enviado: quinta-feira, 16 de novembro de 2017 21:01
Para: miguelimaginario@gmail.com
Assunto: Re: Não existe verdade absoluta

Grande Miguel, quanto tempo?! Até que enfim podemos dizer que é um universitário, kkkk. Parabéns por essa oportunidade de graduação. 

Vamos nos encontrar mesmo, tomarmos um lanche e conversarmos. Gostaria de ouvir mais sobre essas mudanças. Por enquanto, permita-me interagir com os assuntos que mencionou.

Você diz que na Igreja estava limitado a uma visão fechada de ver as coisas. Bem, acredito que se referiu a interpretação bíblica sobre o mundo e a experiência humana nele. Concordo que existem muitas maneiras de interpretá-lo, mas diante de tantas opções, temos a necessidade de escolha e esta é sempre orientada por critérios que a antecede. Por isso, somos igualmente dependentes de uma verdade absoluta, como a premissa de um silogismo. Pense comigo, quando diz que não existe verdade absoluta está confirmando sua existência, sem a qual tal declaração seria uma contradição. O fato é que nem sempre reconhecemos esses critérios que obedecemos. Não podemos negar que exista uma verdade absoluta, normativa e irrefutável. A questão central é sua fonte.

Quando compara o que aprendeu entre a Igreja e a Faculdade valoriza a contradição, sem a qual qualquer afirmação se torna inconsistente, visto que uma proposição não pode ser verdadeira e falsa ao mesmo tempo. Mas para contradizer, antes, tem que assumir uma razão inerrante que julga as partes; portanto, carecemos de critérios mais consistentes que simplesmente resultados da comparação. Penso que a verdade absoluta não é inerente ao homem, mas que sua origem é externa, porque não somos isentos de erro. É por isso que os cristãos se apegam à Bíblia, àquilo que dela se pode aprender e não a si mesmos, sendo falhos, como autoridade para afirmar a realidade do mundo e situarem-se nela.

Por esse motivo temos a necessidade de coerência entre o que percebemos e a lógica. Por exemplo, quem diz que a dor é uma ilusão, satisfaz a lógica budista, mas é irrelevante para nossa experiência no mundo e conosco mesmos. Por isso, a verdade não é abstrata ou uma mera reflexão, pelo contrário, é objetiva e afeta o raciocínio, consciência moral e a relação com o mundo, compreende o todo e não pode ser conclusão determinada por um particular interesse ou desafeto religioso. 

A comparação do ensino bíblico com as fórmulas filosóficas, em alguns aspectos resultam conflitos com a fé. Porque ele vai além delas e, portanto, elas não podem se elevar a ponto de comprovar sua falsidade. Mesmo que o ensino bíblico não seja aceito como verdadeiro pela lógica matemática - a ressurreição de Jesus, por exemplo - a diferença está no fato dos cristãos o admitir com sinceros esforços a história como tal, isso só é possível pela confiança. Para eles, a fonte dessa certeza não se encontra neles, como já disse, mas no testemunho da Bíblia, que é seu elemento externo e firme fundamento. 

Por essa razão, a “visão de mundo” do Cristianismo é definida por ela e se distingue por propósitos claramente práticos. Suas definições sobre o ser humano e o mundo são tão fortes e experimentáveis que é inevitável negá-las.

Quero te convidar a repensar a escolha de recusar o ensino bíblico, como meio de compreensão de si e do mundo, pelos tão recentes que tem explorado no curso de Filosofia, pois no fim, será forçado a tomar emprestado conceitos contra os quais reluta para continuar nessa insistência. 

Pense nisso e depois conversaremos mais sobre o assunto pessoalmente.

Um forte abraço meu amigo!

Ericson

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Com amor,

Ericson Martins

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